Declarada inconstitucionalidade de leis fluminenses sobre gás, telefone, água e energia elétrica
Por votação unânime, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nesta quinta-feira (17), a inconstitucionalidade das Leis n. 3.915/2002 e 4.561/2005, do Estado do Rio de Janeiro, que tornaram obrigatória a instalação, por parte das concessionárias de serviços públicos de água, luz, gás e telefone, de medidores individuais para aferição do consumo.
Como essas leis estão em vigor desde as datas de sua promulgação, a Suprema Corte decidiu modular a decisão para que a inconstitucionalidade declarada somente se aplique a partir de agora (ex nunc), e não desde o início de sua vigência.
A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3558, ajuizada pelo procurador-geral da República sob o argumento de que as duas leis violam os artigos 21, incisos XI e XII, alínea b; 22, inciso IV, e 30, incisos I e V, da Constituição Federal (CF).
Os artigos 21 e 22 da CF atribuem à União a competência exclusiva para explorar diretamente, ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações (artigo 21, inciso XI); os serviços e instalações de energia elétrica (inciso XII do mesmo artigo) e águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão (artigo 22, inciso IV) e, também, legislar sobre eles.
Por seu turno, o artigo 30, em seus incisos I e V, atribui aos municípios a competência para legislar sobre assuntos de interesse local (I) e organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, inclusive o de transporte coletivo, que tem caráter essencial (inciso V).
Alegações
A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (AL-RJ), que aprovou as duas leis, argumentou, preliminarmente, em seu favor, que o STF não deveria conhecer da ADI, porque as leis impugnadas seriam de caráter infraconstitucional. O argumento foi rejeitado pela relatora, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, sob o entendimento de que se trata, sim, de leis que ofendem dispositivos constitucionais.
No mérito, a AL-RJ alegou que as duas leis não interfeririam na competência da União, pois somente visavam ao interesse do consumidor. Elas não estariam legislando diretamente sobre água, energia elétrica, gás e telefone, mas apenas sobre a forma e o conteúdo da cobrança das respectivas tarifas pelas prestadoras dos serviços.
Ainda segundo ela, as leis estariam em conformidade com os incisos V e VIII do artigo 24 da CF, que prevê competência concorrente entre União, Estados e o Distrito Federal para legislar sobre produção e consumo e, também, sobre responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.
A AL-RJ sustentou que o artigo 24, em seu parágrafo 1º, atribui à União a competência para o estabelecimento de normas gerais nesses assuntos, mas que o parágrafo 2º do mesmo artigo não exclui a competência complementar dos estados.
Ela citou, em favor de seus argumentos, decisão do STF na ADI 2359, relatada pelo ministro Eros Grau (aposentado), em que o Plenário da Suprema Corte declarou a constitucionalidade de lei do Estado do Espírito Santo que disciplina a comercialização de produtos, como o gás liquefeito de petróleo (GLP), acondicionados em vasilhames, recipientes ou embalagens reutilizáveis.
Decisão
Em seu voto, acompanhado pela unanimidade dos ministros presentes à sessão de hoje, a ministra Cármen Lúcia rebateu os argumentos da AL-RJ, sustentando que os serviços mencionados estão submetidos a normatização pela União. Ela lembrou que os serviços de eletricidade são regulados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), os de telefonia, pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), e os de água, pela Agência Nacional de Águas (ANA), todas de âmbito federal.
Lembrou, inclusive, neste contexto, que o uso da telefonia não está adstrito a um determinado estado ou município, estendendo-se a todo o país. Por outro lado, o estado não teria competência para se interpor numa relação existente entre a União ou o município e uma prestadora de serviços.
Citando precedentes, ela lembrou decisões do STF no mesmo sentido de hoje, em diversas oportunidades. Entre elas, relacionou o julgamento das ADIS 2337 e 2615, relatadas, respectivamente, pelos ministros Celso de Mello e Nelson Jobim (aposentado).
Na primeira delas, foi declarada inconstitucional uma lei de Santa Catarina que dispunha sobre tarifas de energia elétrica naquele estado. Já a segunda, que estabelecia condições e limites para cobrança de assinatura básica nos serviços de telefonia fixa, também em Santa Catarina, teve suspensa a sua vigência.
Decisões análogas, segundo ela, foram tomadas pela Suprema Corte em relação aos serviços de gás. Um desses casos foi o julgamento da ADI 855, em que a Corte declarou a inconstitucionalidade de lei do Paraná que tornava obrigatória a presença do consumidor no momento da pesagem de botijões de gás comercializados pelas distribuidoras, quando da venda ou substituição do bujão.
Segundo a ministra Cármen Lúcia, a obrigatoriedade de instalação de medidores por parte das concessionárias, prevista nas leis fluminenses objeto da ADI 3558, interfere no serviço, por cuja fiscalização são responsáveis as agências reguladoras, em âmbito nacional.
ADI 3905
Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) declararam, também na sessão de hoje (17), a inconstitucionalidade de obrigação imposta às empresas concessionárias de energia elétrica do Estado do Rio de Janeiro relativa à instalação de medidores de consumo em local visível e de fácil acesso aos consumidores. Foi julgada procedente, por maioria de votos, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3905), ajuizada pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia (Abradee), que questionou a expressão “eletricidade” contida no artigo 1º da Lei fluminense nº 4.901/2006.
A Abradee sustentou que não compete aos estados legislar sobre energia, nem acerca das obrigações das concessionárias de serviço público de distribuição de energia elétrica, matéria inserida no âmbito de competência legislativa privativa da União. Além disso, segundo a autora da ação, a escolha do local de instalação dos medidores é regulada em resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica (Resolução Aneel nº 258/2003), que estabelece critérios e procedimentos a serem adotados por concessionária ou permissionária de distribuição de energia elétrica.
Relatora da ADI, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha afirmou que a alegação da procuradora da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, de que a lei foi editada em defesa dos direitos dos consumidores à informação sobre seu real consumo de energia e apenas repete uma obrigação já imposta pela Aneel, não altera o quadro de inconstitucionalidade porque “o artigo 1º da lei afirma o dever de uma concessionária de um serviço público da União – eletricidade – e estabelece que os medidores deverão ser fixados em tal local, inovando-se portanto a ordem jurídica e interferindo na competência exclusiva da União”.
ADI 3661
Decisão idêntica foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3661) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República contra lei do Acre que impedia empresas de concessão de água e energia elétrica de cortar o fornecimento residencial de serviços por falta de pagamento. Considerada inconstitucional nesta tarde, a Lei nº 1.618/04 proibia o corte dos serviços às sextas-feiras, sábados, domingos, feriados e no último dia útil anterior ao feriado.
FONTE: STF