Suspensa nota técnica sobre troca de celulares defeituosos
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Justiça Federal impede que indústrias eletro-eletrônicas sejam punidas por não fornecer imediatamente outro aparelho ou por não ressarcir ou abater o preço de forma imediata
Estão longe de se encerrar os debates sobre a rumorosa Nota Técnica nº 62, do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, que conferiu nova interpretação ao Código de Defesa do Consumidor para garantir ao consumidor que identificar defeito em aparelho celular o direito de exigir imediatamente, na loja onde foi feita a compra, a substituição do produto, a restituição dos valores pagos ou o abatimento do preço num outro aparelho.
Como noticiado pelo Espaço Vital em 29.6.2010, ensejando vários comentários de leitores, a mudança de interpretação surgiu devido ao aumento do número de reclamações que chegam aos órgãos de defesa do consumidor envolvendo aparelhos celulares.
A nota técnica, aliás, traz como fundamentos para fixar a obrigação dos lojistas vários precedentes de tribunais brasileiros - entre os quais três oriundos do RS.
Os órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor firmaram entendimento caracterizando os aparelhos celulares como produtos essenciais, que passam a ser considerados bens indispensáveis ao atendimento da necessidade do consumidor.
Dados do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec) indicam que o volume de reclamações relativas a aparelhos celulares já representa 24,87% do total de reclamações junto aos Procons e que o principal problema é a garantia de produtos, que alcança 37,46% das reclamações.
Em regra, os varejistas, fornecedores imediatos do produto, não assumem a responsabilidade sobre os defeitos apresentados pelos aparelhos, o que obriga os consumidores a procurar os fabricantes para a solução do problema. Ao procurar os fabricantes, os consumidores são encaminhados às assistências técnicas ou aos centros de reparos dos fabricantes (por meio de postagem nos Correios).
Consumidores relatam, no entanto, diversos problemas no atendimento prestado pelas assistências técnicas: inexistência de assistência no seu município, recusa da assistência em realizar o reparo, falta de informação na ordem de serviço, falta de peças de reposição, demora no conserto do produto para além do prazo de 30 dias, entre outros.
A indústria de aparelhos celulares, porém, não se conformou com a decisão do Ministério da Justiça e, iniciando uma quebra de braço que coloca em lados opostos fabricantes e vendedores contra consumidores, ajuizou uma ação coletiva contra a União.
A ação é movida pela ABINEE – Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica junto à 9ª Vara Federal do Distrito Federal, que busca fazer cessar a eficácia da Nota Técnica nº 62, sob a alegação de que o DPDC é incompetente para emitir atos normativos e ampliativos da proteção legal ao consumidor e que não houve contraditório no procedimento que resultou no diploma expedido.
A ABINEE ainda sustenta que o telefone celular não é bem essencial ao consumidor e que a nota técnica gera excessiva onerosidade aos fornecedores, além de suprimir o direitos destes de investigar as causas dos vícios ou defeitos dos aparelhos e a eventual culpa do próprio consumidor.
O Juízo de primeiro grau indeferiu a antecipação de tutela, mas, em segundo grau, a ABINEE alcançou o seu intento liminar.
O juiz federal convocado ao TRF-1, Ricardo Gonçalves da Rocha Castro, deferiu, em agravo de instrumento, a antecipação da tutela recursal, suspendendo os efeitos da decisão agravada e da Nota Técnica nº 62.
No entendimento do relator, os argumentos da ABINEE são plausíveis, pelos seguintes motivos:
1 – é questionável que uma nota técnica do DPDC tenha caráter normativo das relações de consumo, ampliando direitos dos consumidores e dos devedores do fornecedor;
2 – em nome da ampla defesa e do contraditório, as empresas associadas à ABINEE tinham direito de ser ouvidas no procedimento administrativo instaurado pelo DPDC, o que não teria ocorrido;
3 – é questionável que o aparelho celular seja considerado essencial e de interesse público. “Uma coisa é o serviço em si, outra coisa é o aparelho”, anotou o juiz;
4 – a troca do aparelho defeituoso, a restituição ou o abatimento do valor pago – todos imediatamente – privariam os fornecedores do seu direito de sanar os defeitos ou vícios no prazo legal de 30 dias previsto no CDC e de avaliar se o consumidor fez uso inadequado do telefone;
5 – a troca imediata do aparelho causa prejuízo financeiro “considerável” aos fornecedores, em razão do elevadíssimo número de usuários de telefonia móvel, uma vez que seria difícil o ressarcimento aos fornecedores nos casos em que os defeitos são causados pelosa próprios consumidores.
O DPDC do Ministério da Justiça deverá comunicar aos órgãos estaduais e distrital de proteção ao consumidor (Procons) acerca da decisão judicial. Com isso, por determinação do relator, está impedida a instauração de procedimentos administrativos destinados a aplicar sanções aos associados da ABINEE com base na Nota Técnica nº 62.
FONTE: CONJUR