Brasil precisa fomentar cultura do não-litígio, dizem ministros

O Brasil precisa desenvolver a cultura do não-litígio. A opinião é de especialistas que participaram, nesta terça-feira (29/10), de audiência da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). O objetivo era discutir três projetos de lei do Senado que tratam de mudanças na Lei da Arbitragem e na criação de uma lei da mediação como instrumento para a solução de conflitos. Para os debatedores, não adianta criar e aperfeiçoar as leis se não houver uma mudança de mentalidade dos envolvidos nos processos judiciais.

“Nós temos que trazer para o nosso país a cultura do não-litígio. Nas nossas faculdades de Direito aprendemos e ensinamos a processar, a litigar, a recorrer eternamente no processo, mas não aprendemos a fazer um acordo, chegar a um consenso, buscar uma arbitragem, buscar uma mediação” afirmou o representante do Ministério da Justiça, Flávio Caetano.

Para ele, o Brasil está atrasado em relação a essa cultura e as mudanças nas leis são o início dessa conscientização, que passa, também pela inclusão do tema nas provas da Ordem dos Advogados do Brasil e de concursos públicos e por uma estratégia nacional de redução de litígios.

Duas das proposições em discussão na CCJ foram elaboradas pela comissão de juristas que funcionou no Senado até outubro. As propostas tratam da reforma da Lei de Arbitragem (PLS 406/2013) e de um marco legal para a mediação (PLS 405/2013), ainda não existente no país. O outro projeto (PLS 517/2011), do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), é anterior ao trabalho da comissão. O texto institui e disciplina o uso da mediação como instrumento para prevenção e solução consensual de conflitos.

Na arbitragem as partes em conflito escolhem, de comum acordo, um juiz privado para tomar a decisão. Já na mediação não há um juiz, e sim um mediador que, em vez de tomar uma decisão, estimula as partes em conflito a encontrar, elas próprias, uma solução consensual. Segundo o ministro do Superior Tribunal de Justiça Luiz Felipe Salomão, que presidiu a comissão de juristas, a mediação tende a ser mais utilizada para demandas de massa, enquanto a arbitragem tende a se concentrar em questões de maior porte, que envolvem valores maiores.

Tanto a arbitragem quando a mediação são apontadas como instrumentos para “desafogar” o Judiciário, reduzindo a quantidade de disputas judiciais.  Números apresentados por Salomão mostram que, nos últimos 25 anos, o número de processos no Brasil cresceu 80 vezes, enquanto o número de juízes cresceu quatro vezes.

“Os projetos são um passo muito substancial, que se dá em direção a tirar, a desafogar do Judiciário uma boa parcela dos processos que hoje criam esse problema”, afirmou Salomão, que alertou, no entanto, para a necessidade de outras mudanças na Justiça, como nas questões processuais.

O ministro do STJ Aldir Passarinho Júnior, por sua vez, se diz cético com relação aos resultados da arbitragem na redução do número de disputas na Justiça. Segundo o ministro, o número de processos julgados em um ano nas esferas estaduais e nas federais supera os 23 milhões. Para ele, a arbitragem é uma grande solução para as partes, mas não para o Judiciário.

“Ainda que potencialmente nem todos pudessem se sujeitar a uma arbitragem, isso é muito, comparativamente com o que as câmaras e os centros de arbitragem poderiam realmente solucionar. Uma prestigiosa Câmara de arbitragem deste país divulgou, recentemente, um relatório de que tinha realizado 39 arbitragens no ano de 2012”, argumentou.

Outro ponto ressaltado pelos participantes é o alto custo dessas alternativas às ações judiciais. Para Passarinho, é preciso enfrentar a questão para que o uso desses instrumentos se propague, opinião semelhante à do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.

“Tem que ter muita vantagem para conciliar. Evidente que esse processo só ganha força se for mais conveniente, mais barato e mais seguro eu conciliar do que litigar em juízo”, disse Adams. Para ele, nas ações que envolvem o setor público, a lei pode avançar com muito mais firmeza. Embora não seja possível forçar a negociação, na opinião do advogado-geral, é possível criar “fortes instrumentos” de indução a esse processo.

Presidente da CCJ e relator dos projetos, que tramitam em conjunto, o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) se mostrou otimista com o resultado da audiência pública e com a convergência sobre muitos dos pontos da discussão. Para ele, há uma “sede de mudança” que pode gerar bons resultados na comissão.

O senador informou que, na próxima quinta-feira (31/10), será realizada outra audiência pública para debater os projetos, com a presença de representantes do ministério Público, do Judiciário e da Confederação Nacional da Indústria, além de especialistas. Vital do Rêgo afirma que pretende apresentar em breve seu relatório para que o projeto possa ser votado ainda em 2013 pelo Senado. Com informações da Agência Câmara.

FONTE: CONJUR

Comentários do Blog:

Quem enfraqueceu a Lei de Arbitragem no Brasil foi o Poder Judiciário que ficou com receio de perder o poder exclusivo de julgar, acolhendo ações civis públicas propostas pelo Ministério Público que questionavam e muito a forma de arbitragem praticada no começo da edição da lei no país. Lembro que fora questionado à época a exclusão da expressão "juiz arbitral", bem como a utilização de atos semelhante a ats processuais (citação, sentença entre outras) acusando as Câmaras de Mediação e Arbitragem de irregularidades e inconstitucionalidades, pois a atividade jurisdicional é privativa aos juízes. 

Agora estão chegando a conclusão dos erros cometidos. A Lei de de Arbitragem é uma saída bem consistente para atacar a morosidade da Justiça. Por óbvio que existia muitas irregularidades e situações eivadas de má-fé no âmbito das recém instituídas Câmaras de Arbitragem. Essa situação criou uma inibição na utilização desta forma tão antiga de composição de conflitos. O governo falhou não implementando uma política de esclarecimento a população sobre a correta forma de arbitragem no Brasil. 

A mediação e arbitragem é fundamental para incentivar as pessoas a tentar resolver seus conflitos administrativamente, buscando em último caso o Poder Judiciário.